sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Colecção Almada I

"As pessoas que eu mais admiro são aquelas que nunca acabam".
Almada Negreiros


Foi num solarengo Sábado, a 13 de Setembro, que um grupo de professores da Escola João Afonso de Aveiro e seus acompanhantes trilharam um dos primeiros encontros com a vida e obra de José Sobral de Almada Negreiros. Chegados a Lisboa, iniciou-se o percurso com a visita à Fundação Calouste Gulbenkian, onde a professora Margarida Lemos apresentou a obra "Começar", a última criação do Mestre Almada, de um modo simples, conciso e completo.
Após a visita à exposição de pintura no Cento de Arte Moderna segui-se a apresentação d' "A Cena do Ódio" interpretada pelo Bruno, no anfiteatro ao ar livre, nos jardins da Gulbenkian. Como leiga que sou, considero que tenha sido um momento único e marcante, quer pela força e ira que saía do fundo de um olhar revoltado e indignado, quer pelo amor e respeito com que abraçou a obra do Mestre, quer pela caracterização e pela expressão que, em determinados momentos, num perfil facetado, esboçava ares de Almada.

Finalizámos a visita na Gare Marítima Rocha Conde de Óbidos onde a carga emocional vivida em despedidas com sabor a um "até nunca", foi por Almada estampada em frescos com um tamanho tão imenso, quanto a saudade que ficava.

Todo o percurso teve um sabor especial, graças ao facto de termos sido presenteados e honrados com a companhia do filho de Almada Negreiros - o Senhor Arquitecto José Almada Negreiros -, e sua nora - a Senhora Dona Maria José Almada Negreiros -, cujos apontamentos e testemunhos naturalmente introduzidos no decorrer da visita, ao sabor do que as memórias e o conhecimento revelavam, permitiram um genuíno aproximar do Homem que foi, é e será Almada. Um bem-haja pela sua presença simpática, simples e autêntica.

A Doutora Bárbara constituiu também uma presença agradável nessa visita. Aluna de pós-doutoramento, de nacionalidade italiana, desenvolveu os seus estudos de doutoramento sobre a obra de Almada Negreiros. A paixão, encanto, admiração e respeito que nutre pelo Mestre Almada e sua obra têm sido a força motriz para executar um trabalho integrador, paciente e sério, tentando sempre beber das fontes mais fidedignas que incansavelmente procura. Parabéns e força para os passos seguintes.

Palavras, Arte, Geometria e Número em Almada Negreiros constituiram então testemunhos ímpares de inigualável valor que nos encheram de orgulho, talvez por Portugal também neles ser. Não quero, contudo, correr o risco de tomar como nossa uma obra que vale por ser livre, por ser Almada.

Foi então neste contexto que surgiu a ideia de criar a
Colecção Almada como forma de lembrar um pouco mais aquele dia. Os brincos foram assim feitos sob inspiração nalgumas obras criadas pelo Mestre Almada. Foi com prazer, entusiasmo e dedicação que fiz cada um. Espero que vos façam sorrir.


Almada Negreiros

Negreiros

"Eu tenho tanta fé na minha estrela, (...) que há-de brilhar ainda quando eu cá não estiver". Almada Negreiros

Almada Negreiros nasceu em S. Tomé e Príncipe a 7 de Abril de 1893. Foi um dos fundadores da revista "Orpheu" (1915), veículo de introdução do modernismo em Portugal, onde conviveu de perto com Fernando Pessoa. Além da literatura e pintura a óleo, Almada desenvolveu composições coreográficas para ballet. Trabalhou em tapeçaria, gravura, pintura mural, caricatura, mosaico, azulejo e vitral. Faleceu a 15 de Junho de 1970 no Hospital de S. Luís dos Franceses, em Lisboa, no mesmo quarto onde morrera seu amigo Fernando Pessoa.

O olho de Almada

Olho I










Olho II













O menino d'olhos de gigante

[...] Pela serra ao luar
ia um menino sozinho

sem sono pra se deitar

Ia o menino a pensar
porque seria ele só
sem sono pra se deitar?

Ia o menino a pensar
que há tanto por pensar

e a cidade a descansar.

Ia o menino a pensar
que se nasce pra pensar
e nunca pra descansar.

[...] Ia o menino a arranjar
muita força pra pensar
e o próprio sonho ganhar!

[...] Veio o gigante de norte
disfarçado com o luar, julgava que eu dormia,
começa a tirar-me os olhos.

Dá-me os meus olhos, gigante,
dá-me os meus olhos, ladrão!
os olhos nunca se tiram
não servem senão ao dono.

[...] Bem sei que eu sou menino
mas esses olhos são meus,
se são olhos de gigante
foram postos 'qui por Deus.
[...]

Almada Negreiros, Outubro 1921

2 comentários:

bekas disse...

Por que não incluir aqui a história do menino dos olhos de gigante, quando aluno em Coimbra, após a saída dos jesuítas?
Aí vai ela... "Um dia, era o Zé pequeno, ia a correr por um desses corredores e quando deu a curva, esbarra com o director que o agarrou assim pelos ombros «diz-me uma coisa. Eu tenho 360 alunos, e todos têm os olhos na cara, porque é que tu tens a cara nos olhos?!» «Porque é que só tu tens a cara nos olhos?»
In “Conversas com Sarah Affonso” de Maria José Almada Negreiros

bekas disse...

Estou mesmo "proud, proud, proud" do teu trabalho. "Du bist zu gut fuer diese Welt!!"